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A Utilidade Dos Minerais

Publicado: 02/02/2011 por Kakao Braga em Atualidades, Meio Ambiente, Opinião, Saúde

:: Por Pércio de Moraes Branco* ::

O ser humano usa, para sobreviver, muitos produtos de origem animal: ovos, leite, carne, couro, pele, óleo, etc. Da mesma maneira, aproveita inúmeros produtos vegetais: arroz, feijão, trigo, milho, algodão, centeio, cevada, frutas, verduras, legumes, etc. Esses produtos fazem parte da nossa vida e deles nos utilizamos todos os dias, sempre que nos alimentamos.

Mas, embora não tão visíveis e de presença mais difícil, às vezes, de perceber, os produtos extraídos do reino mineral são igualmente importantes e imensamente variados, como veremos a seguir. Eles, porém, têm uma fundamental diferença em relação àqueles de origem animal e vegetal: não são renováveis. Seu processo de formação é tão lento quando comparado com a vida humana que devem ser considerados como recursos finitos, ou seja, que se extrai uma vez só de um determinado lugar. Podem, sim, ser reciclados, como se faz com as latas de alumínio, mas, a produção original não se renova.

Metais
Os minerais nos fornecem os metais, indispensáveis à fabricação tanto de coisas enormes, como aviões, quanto daquelas minúsculas, como alfinetes, clipes  ou percevejos.

O alumínio tem mais de 4.000 aplicações diferentes, sendo usado em navios, automóveis, aviões, utensílios domésticos (como panelas), embalagens, tintas, esquadrias de janelas, abrasivos, cimento, refino do petróleo, tijolos refratários e explosivos. Ele é extraído principalmente da bauxita, um solo argiloso e leve que se forma em regiões tropicais. Mas pode ser obtido também de minerais como criolita, nefelina, alunita e leucita.

O antimônio é usado principalmente na forma de ligas com chumbo, que servem para baterias, tubos de creme dental, soldas, tintas e balas de revólver, por exemplo. Mas, também em fogos de artifício, fósforos, medicamentos, vidros e em cerâmica. O metal é extraído de pelo menos sete minerais, dos quais o principal é a estibinita.

O chumbo é extraído de sete minerais, dos quais o principal é a galena. Ele é usado sobretudo em baterias (40% do consumo), como aditivo na gasolina e como isolante de raios X, em tintas, vidros especiais (os chamados cristais), corantes, inseticidas e em projéteis de armas de fogo.

O cobre, bom condutor de calor e eletricidade, é usado em fios elétricos, na fabricação de bronze e latão, em defensivos agrícolas, tratamento da água e em objetos ornamentais. Pode ser extraído de pelo menos dezessete minerais, dos quais o mais importante é a calcopirita.

O estanho é um metal fornecido principalmente da cassiterita. Ele é útil na fabricação de latas de conserva, na obtenção do bronze (usado em esculturas e nos sinos), também em refrigeradores, condicionadores de ar, radiadores e soldas, por exemplo.

O ferro é o mais comum, o mais barato e o mais importante dos metais.  É extraído principalmente do mineral hematita, mas também de oito outros minerais.  É usado em um enorme número de produtos, principalmente quando transformado em aço.

O manganês é outro metal que tem muitas aplicações e é extraído de pelo menos quinze minerais. É empregado em ligas metálicas, tintas, vidros, cerâmica, aço, automóveis e utensílios domésticos.

O níquel serve principalmente para obtenção de aço inoxidável e outras ligas resistentes à corrosão. É empregado também em moedas, cerâmicas, ímãs, alto-falantes, automóveis, revestimento de outros metais, reatores nucleares, baterias, catalisadores e outros usos. É obtido de treze minerais diferentes.

O ouro, que todos conhecem e apreciam tanto, é usado principalmente em moedas e jóias, mas também em instrumentos científicos e em equipamentos eletrônicos. A principal fonte de obtenção é o ouro nativo (não combinado com outros elementos químicos) e mais alguns poucos minerais.

A platina usa-se na Odontologia, instrumentos de laboratórios, mísseis, fornos elétricos de alta temperatura, catalisadores e muitos outros produtos. É um metal bem mais caro que o ouro, extraído de alguns poucos minerais, como sperrylita e platinirídio.

 A prata, também importante e valiosa (mas menos que o outro e a platina), é usada em jóias, moedas, espelhos, talheres, soldas, Odontologia, explosivos, fotografia, radiografias, produção de chuvas artificiais e catalisadores por exemplo. É extraída de quatorze minerais e é também um subproduto na metalurgia de outros metais.

O zinco é usado na fabricação de latão, em automóveis (nos velocímetros, por exemplo), tintas, borrachas, cosméticos, medicamentos, pesticidas, em teclados, plásticos, sabão, baterias, tecidos, lâmpadas fluorescentes, máquinas de lavar roupa e em pigmentos. Obtém-se principalmente da esfalerita, da franklinita, da smithsonita e DA hemimorfita.

Além desses metais, mais conhecidos, há vários outros que são obtidos de minerais, como berílio, cobalto, cromo, irídio, mercúrio, molibdênio, nióbio, paládio, ródio, rutênio, tântalo, telúrio, titânio, tório, tungstênio, vanádio e zircônio.

Combustíveis nucleares
Os reatores nucleares são abastecidos com tório ou urânio, ambos extraídos de minerais. O tório é usado também em lâmpadas de gás portáteis, ligas com magnésio, eletrônica, lâmpadas elétricas e vidros para lentes. O urânio, o principal combustível nuclear, emprega-se também em explosivos atômicos, produção de raios X, fotografia, vidros e esmaltes.
Outro elemento radioativo, o rádio, não é combustível, mas é usadas como fonte de nêutrons, no tratamento de câncer, tintas luminosas e em radiografias industriais. 
 
Pedras preciosas
As pedras preciosas são importantes na economia de muitos países, inclusive do Brasil que é um dos maiores produtores do mundo.  Nosso país produz cerca de 90 tipos diferentes de pedras preciosas, usadas em jóias e objetos decorativos.  Nem todas as gemas são muito caras, mas algumas, como diamante, esmeralda, rubi, safira, turmalina Paraíba, alexandrita e opala-negra atingem preços altíssimos.
O diamante que não serve para uso em jóias tem muitas aplicações na indústria em ferramentas de corte e perfuração. As granadas e o quartzo são usados como abrasivos.  Rubis e safiras de baixa qualidade são usados como abrasivos e em relógios.

Medicamentos
Um bom número de elementos químicos usados nos medicamentos são extraídos dos minerais. Entre eles devem ser citados, bismuto (usado também em tintas e esmaltes); cálcio; enxofre; flúor; boro (também útil em esmaltes, vidros, cosméticos e detergentes); bromo (usado também em fotografias e inseticidas); iodo; magnésio (empregado igualmente no curtimento de couro, seda artificial, cimento sorel e ligas); mercúrio (também útil na indústria elétrica, herbicidas e produção de cloro e sódio) e o zinco.

Alimentos
Embora pareça estranho ver os minerais como alimento, a verdade é que todos nós comemos diariamente um mineral, o sal de cozinha. Ele é o mineral halita, um cloreto de sódio.

Indiretamente, outros minerais, como a apatita, contribuem para nossa alimentação, fornecendo fertilizantes agrícolas.

Abrasivos
Diversos minerais são usados como abrasivos, entre eles, granadas, coríndon, quartzo, estaurolita.

Asbestos
Asbestos são um grupo de silicatos fibrosos que inclui crocidolita, crisotilo, antofilita, tremolita e amosita. Esses minerais são usados em tecidos à prova de fogo, isolantes térmicos e elétricos, adicionados ao cimento, em lonas e pastilhas de freios, fabricação de papel, plásticos, borracha e material para filtração.

* geólogo, lexicógrafo e autor brasileiro. É autor e co-autor de livros tidos como referência na área de mineralogia[1] e foi diretor do Museu de Geologia por doze anos.

:: Por Nicholas A. Christakis e James Crabtree*::

Tradução: Eloise De Vylder

 Se os amigos dos seus amigos começam a engordar, é provável que aconteça o mesmo com você – mesmo que você não os conheça e mesmo que more a centenas de quilômetros de distância. A obesidade se espalha como um modismo; e é contagiosa.

Esta surpreendente descoberta, resultado de um estudo de 30 anos em Massachusetts, foi descrita por Nicholas A. Christakis e James H. Fowler em seu novo livro, “Connected: The Surprising Power of Social Networks and How They Shape Our Lives” [algo como “Conectados: O Surpreendente Poder das Redes Sociais e Como Elas Moldam Nossas Vidas”]. A pesquisa mostra que o mesmo fenômeno se aplica a fumar e a uma série de outros comportamentos e atitudes como o vício em bebida, a depressão, doações caritativas, práticas sexuais – e até decisões de se casar, divorciar, ter filhos ou votar.

Por que isso é importante? Porque desde o cuidado com a saúde até a mudança climática, os governos de hoje enfrentam uma variedade de problemas em que precisam persuadir as pessoas para mudar seu comportamento. Mas em vez de se fiar em seus poderes de persuasão, os políticos deveriam considerar estudar a ciência das redes.

A ideia básica da ciência das redes é simples. As pessoas se juntam em grupos com padrões de laços específicos, e esses padrões têm efeitos importantes na forma como se comportam. Um exemplo improvável são os musicais da Broadway.

Brian Uzzi é sociólogo na Universidade Northwestern, em Chicago. Ele também é um grande fã de musicais. De “Cats” até “Spamalot”, os musicais são um bom negócio há décadas, mas os investidores sempre precisam adivinhar quais peças farão sucesso. Intrigado, Uzzi usou a ciência das redes para descobrir por quê. Ele reuniu um conjunto de dados sobre 321 musicais que foram lançados na Broadway entre 1945 e 1989, verificando especialmente se as equipes formadas por produtores, coreógrafos, roteiristas e diretor haviam trabalhado juntas antes ou não.

Depois de processar as estatísticas, ele descobriu algo notável. Equipes que nunca haviam trabalhado juntas não tiveram tanto sucesso: suas fracas redes implicavam a falta de visão criativa e uma série de desempenhos insatisfatórios. No outro extremo, equipes que haviam trabalhado juntas com sucesso também tinham uma tendência a produzir fracassos. Às vezes, por uma falta de ideias criativas vindas de fora, a equipe simplesmente reelaborava as mesmas ideias que funcionaram no último espetáculo; outras vezes, por falta de gente nova, elas desenvolviam sua visão de formas absolutamente excêntricas. De qualquer forma, dificilmente o sucesso se repetia.

Mas, entre esses dois grupos, Uzzi descobriu algo importante. Ele encontrou um ponto de equilíbrio: grupos com a mistura exata de participantes novos e antigos produziam sucessos com uma frequência confiável. Essa variação na profundidade dos laços permitia a facilidade de comunicação e alimentava uma criatividade maior – as novas ideias das pessoas de fora se misturavam à experiência dos antigos. Não importava qual era o tema do musical ou quem o estivesse estrelando. Seu sucesso se espalhava pela estrutura da rede, unindo a equipe. O mesmo foi comprovado nas áreas da invenção científica e da inovação nos negócios.

Juntando esses dois insights – de que a informação que flui nas redes sociais pode mudar o comportamento, e de que o formato das redes muda dramaticamente seus resultados -, surgem algumas implicações intrigantes. Se é possível fazer musicais lucrativos simplesmente configurando a equipe de produção de forma adequada, por que a mesma estratégia não funcionaria para quem comanda escolas, hospitais, até mesmo um departamento do governo? E se é possível fazer com que as medidas antifumo levem em conta a capacidade das pessoas de influenciarem umas às outras, não há nenhuma razão para que as mesmas técnicas de redes não sejam usadas para cortar problemas como o alcoolismo, a obesidade ou reforçar a segurança do trabalho.

Expandindo essa ideia, se criar o tipo certo de redes sociais ajuda as pessoas a se relacionarem de forma mais eficaz, será que o Estado não deveria procurar pessoas que ajudassem a construir essas ligações? Especialistas na teoria do capital social difundiram essa ideia durante anos, sem muitos resultados. Mas eles têm um ponto importante: os governos deveriam tentar construir novos sistemas sociais que apoiem os laços sociais, e elaborar políticas que os levem em consideração.

Por que parar por aqui? As políticas de rede poderiam ajudar a incentivar novos tipos de crescimento que ajudem a nos tirar da recessão. A inovação nos negócios é fortemente influenciada pela estrutura de redes de equipes de projeto e pela comunicação entre parceiros comerciais ou cientistas. As políticas poderiam tirar vantagem disso, assim como poderiam tentar estabelecer novas normas sociais para a conservação de energia doméstica. Talvez a perspectiva mais excitante de tudo isso seja o potencial para acabar com o isolamento social. A pesquisa mostra que não ter amigos, ou mesmo ter uma rede social pobre, pode ter um custo assustador: é mais provável que uma adolescente cujos amigos não se dão bem pense sobre suicídio do que uma outra cujos amigos se dão bem – independentemente de quem são os amigos, ou de como ela se dá com eles.

Os conservadores costumam se preocupar com as liberdades individuais, enquanto os liberais se preocupam com o bem-estar dos grupos sociais. A ciência das redes mostra que uma discriminação como esta é, no mínimo, extremamente simplista. Observe como os indivíduos se juntam em grupos e você também perceberá como o fato de participar de um grupo afeta os indivíduos. Ver os dois lados pode não só melhorar a política e economizar dinheiro, mas também ajudar nossos políticos a serem mais persuasivos – do
jeito certo.

*Nicholas A Christakis é professor de medicina, política de saúde e sociologia na Universidade de Harvard e co-autor de “Connected” com James H. Fowler. James Crabtree é editor-executivo da Prospect.

047a:: Por Elisa ::

No final do mês de julho fui para um retiro de meditação Vipassana. É incrível como isso mexe com a curiosidade das pessoas. Muitos dos meus amigos e conhecidos vieram me perguntar como foi e, principalmente, se foi difícil passar 10 dias sem falar. Resolvi compartilhar a experiência com todo mundo. Afinal, é algo que vale a pena. Espero que também ache.

Como o retiro se localiza em Miguel Pereira…  as opções para chegar lá eram um pouco complicadas, depois de muito pensar, decidi ir de carro. Peguei o meu GPS e coloquei o pé na estrada. Até um determinado ponto, perfeito. Tudo certinho. Mas, próximo a cidade de Vassouras… percebi que embora eu trafegasse pela estrada, o GPS indicava que eu praticamente estava dentro da mata ou pior, do rio. A voz feminina tão educadinha falava pra entrar a direita, mas não tinha direita para eu entrar… A tecnolo3255684522_8d3713445fgia é magnífica, mas nem sempre perfeita. Tenho certeza de que se houvesse GPS na época de Móises, quando  ele ficou  40 anos perdido no deserto  com seu povo, certamente seria um GPS igual ao meu. Como não podia esperar tanto tempo como Moises para chegar ao meu destino, resolvi usar outros métodos tradicionais: parei num posto de gasolina e perguntei… Liguei para o retiro para ter as indicações. Devia aproveitar, afina ainda podia falar.

Após chegar e me acomodar, iria fazer um lanche e receber as orientações. Durante a permanência no retiro deveríamos observar 5 preceitos: abstenção de matar qualquer ser, de roubar, de toda atividade sexual, de mentir e de todo tipo de intoxicantes. Isso ia ser, como diriam os americanos, “piece of cake”. Todos os alunos devem observar o Nobre Silêncio – o silêncio do corpo, palavra e mente – desde o início do curso até a manhã do último dia. Daquele momento em diante era proibida toda forma de comunicação com os outros alunos, seja por meio de gestos, palavras, notas escritas, etc. Bom, aí, como bons brasileiros comunicativos, seria um pouquinho mais difícil. Mas, tentaria. À noite começou e o nobre silêncio também.

O problema é que minha cabeça estava na n3254855937_d8d9ab9b56obre atividade. Escutava todo tipo de música de Alcione a Cidade Negra. Eita, cabeça que não parava. De repente… “ Lá vem o negão cheio de paixão… te catar, te catar…” Fala sério, será que a minha mente não tinha um repertório melhor? Nada contra essas músicas… Mas, vamos combinar, nada a ver com um retiro de meditação. Até eu conseguir desligar o rádio interno, levou um bom tempinho, mas consegui.

Fui tomar o meu banho, afinal uma mente sã começa por um corpo são e limpo, é claro. Entrei no chuveiro pensando nos voluntários, o pessoal da cozinha, da organização. Ninguém receberia nada por estar lá. “Puxa, que almas abnegadas” E pensando nisso meus olhos percorreram o banheiro e pararam no ralo. “Havia alguém que buscava aquietar a mente e certamente após o banho era uma alma descabelada. santi1Bom, não iria condenar ninguém. Afinal, a queda de cabelos é natural… mas, provavelmente a dona dos ex-cabelos, além de estar descabelada, deveria ter um severo problema de visão. Afinal, como não ver aquela montanha de cabelos? Impossível. Enfim, não pensaria nisso”. Mas, a cena se repetiu todos os dias, durante 10 dias. Ao final do período se tivesse juntado todos os cabelos poderia fazer uma peruca.

Quando na manhã seguinte, o sino tocou às 4 da manhã, percebi que aquilo era bem real e que a meditação começaria às 4h30 e o pior, o café da manhã só seria às 6h30.

A programação diária era sempre a seguinte:

04:00      Chamada
04:30-06:30   Meditação na sala ou no quarto
06:30-08:00   Desjejum e descanso
08:00-09:00   Meditação em grupo na sala
09:00-11:00   Meditação na sala ou no quarto, segundo as instruções do professor
11:00-12:00   Almoço
12:00-13:00   Descanso e perguntas individuais com o professor
13:00-14:30   Meditação na sala ou no quarto
14:30-15:30   Meditação em grupo na sala
15:30-17:00   Meditação na sala ou no quarto, segundo as instruções do professor
17:00-18:00   Lanche e descanso
18:00-19:00   Meditação em grupo na sala
19:00-20:15   Palestra do professor na sala
20:15-21:00   Meditação em grupo na sala
21:00-21:30   Perguntas abertas na sala
21:30   Repouso. Apagam-se as luzes

Quando vi a programação percebi que eram mais de 11 horas de meditação. Questionei sinceramente a minha sanidade. Tudo bem que eu era considerada louquinha por meus amigos, mas 11 horas de meditação era um exagero total. Porém, já que estava ali, iria tentar… No primeiro dia, o sono chegava a toda hora. Senti minha cabeça pesada. Minhas costas doloridas, minhas pernas dormindo antes de mim… Para acordar abria os olhos e observava as outras pessoas meditando ou quase… Algumas cabeças pendiam para frente. Então, percebi que não era só eu que estava com sono.

Sempre achei lindo, as pessoas sentarem em posição de flor de lótus. Tão lindo! Tentei. Nada. As pernas não obedeciam. Tentei meia flor de lótus. Já que uma inteira não dava, meia podia ser… Foi quando ouvi um plect. “Alguém tem um alicate? Ou quem sabe uma chave de fenda? ”, pensei em vão. Não podia falar. Ai, Meu Deus! Depois de muito esforço consegui soltar as pernas. Percebi então que o melhor era ficar, já que eu sou brasileira, na posição de vitória régia mesmo. Mais seguro. Afinal, as vitórias régias são tão lindas também. Virei fã incondicional das Vitórias Régias.

A comida vegetariana nunca satisfez o meu paladar. Gosto de pratos com alho3255680172_67b4e07e0d, sal, ou seja, mais condimentados. Mas, só percebi que, embora não seja fã, a comida fazia uma falta danada. Num dos dias, pensei em tomar banho quando tocasse o sino para o almoço e depois, almoçar. Normalmente, a qualquer hora, levava-se uma eternidade em filas para tomar banho, mas na hora do almoço não. Quando cheguei ao refeitório, qual foi a minha surpresa. Não tinha sobrado nada além de salada. Deu-me uma tristeza tão grande que senti meu corpo todo chorar. Fazer o quê, né? Todos fazemos escolhas o tempo todo, e eu escolhi tomar banho. Azar. Ia ter que esperar até o lanche. Naquele dia, fui meditar com uma sensação de vazio… interno.

Sempre ao final das meditações, era colocada uma gravação do Goenka, o responsável por difundir3255681848_cd788c620c_o a técnica, entoando cânticos. Num dos dias, ouvi uma segunda voz acompanhando o cântico, tão cavernosa quanto o do velho mestre. Abri discretamente um dos olhos para ver de onde vinha tal som… e qual não foi a minha surpresa ao descobrir que era a minha barriga. Que vergonha! Será que alguém tinha percebido? Mas, o pior estava por vir… Em outra ocasião, no meio da meditação, ouvi um rugido monstruoso, parecia um animal ferido. Não, não era. Era meu estômago de novo, só que agora partira para a carreira solo. Não tive dúvidas, ao voltar para o quarto, tomei um remédio. Será que era isso que eles queriam dizer com intoxicantes? Bom, de toda maneira, meu estômago não voltou a incomodar mais. Ficou quieto. Acho que aderiu ao nobre silêncio por livre e espontânea pressão. A minha.

Fiquei muito impressionada com o fato de não podermos matar nenhum ser vivo. Nunca fui adepta de matar nada. A não ser baratas e pernilongos. Enfim, fui para o quarto meditar, ao me levantar da cama, meu coração parou. Havia sentado numa formiga, que estava com as patinhas para cima. Será que poderia tentar ressuscitá-la? Nunca tinha tentado fazer boca a boca, muito menos numa formiga. Se tentasse massagem cardíaca, se ela não tivesse morrido, certamente morreria. Pensei em pedir socorro. Meu coração disparou. Precisava de um copo de água com açúcar… mascavo (o refinado nem pensar). Mas, como? Não podia falar. Pensei em fazer um funeral. Sei lá. Algo que aliviasse a minha culpa. Naquele dia fui falar com o professor assistente, que me garantiu que não deveria ficar pensando nisso, pois foi sem querer, mas “há que tomar mais cuidado da próxima vez”. Pude enfim, respirar aliviada. Dias depois, vi uma das minhas colegas de meditação matar um pernilongo sem dó nem piedade. Enfim, cada um encara as coisas de modo tão diferente!

075Adorava o cheiro do mingau de manhã, os banhos, olhar a natureza após as refeições, a neblina, as palestras à noite. Mas, reconheço que pensei em fugir duas  vezes. Como havia deixado os objetos importantes sob a guarda da administração: dinheiro, documentos, chave do carro, cartões, estava órfã de pai e mãe. Apesar de estar com um cartão de débito,  desisti da idéia quando lembrei da cidadezinha mais próxima. Não parecia ter caixa eletrônico. E, com eu viajaria sem documentos? Faltavam poucos dias pra terminar. Eu podia agüentar. Afinal, o problema é que quando sentimos ameaçados na nossa zona de conforto é assim mesmo.

Brincadeiras a parte… Nesse processo, posso contar várias coisas, mas a principal delas é que aprendi a me conhecer melhor, a repensar meus dilemas sob a ótica de que tudo é impermanente. Sempre gostei muito da minha própria companhia. Já tinha percebido isso numa outra viagem que fiz e adorei ficar sozinha. Eu não ia morrer ou sofrer se não falasse com ninguém. Aprendi a controlar, ou a não dar atenção, para as dores do corpo, que até foram poucas perto do que eu esperava.  A grande certeza a que cheguei é minha mente era capaz de me distrai3254853421_5c31168becr constantemente. Pela primeira vez em muito tempo, e olha que já fiz dança, natação, aeróbica, bicicleta, percebi que há sensações pelo meu corpo inteiro. Ele pulsa, com lembranças de cada momento, de cada vão sofrimento, com cada prazer. Isso era incrível. Testei também a minha paciência. Aprendi a olhar os outros de outra forma, com mais aceitação, com mais compreensão. Tenho me policiado para não fazer julgamentos nem deixar o preconceito imperar. Aprendi a respeitar mais a vida, inclusive dos pequenos insetos. Aprendi a ser mais tolerante. Percebi que a comida vegetaria, apesar de eu não gostar tanto assim, fez muito bem ao meu organismo (estou até pensando em adotá-la em minha dieta diária). Conheci gente maravilhosa. E, depois de tanto tempo, eu finalmente conheci ou reconheci alguém super importante: eu mesma. E foi uma descoberta incrível. Continuo com a máxima: “Eu me amo. E a recíproca é verdadeira”.  Porque acho que só a gente se amando a gente pode amar os outros e valorizar a vida. Assim que for possível pretendo repetir a dose, ou seja, fazer mais um retiro e também ser voluntária em outro. Por isso, recomendo mesmo. Como li em algum lugar é um divisor de águas na vida de qualquer pessoa.

Na vida não podemos evitar as mudanças(cambios), não podemos evitar as perdas. A liberdade e a felicidade se fundamentam na facilidade com que enfrentamos as mudanças. (BUDA)
 
Todas as manhãs renascemos. O que fazemos hoje é o que mais importa. (BUDA) 

Com os pensamentos, as palavras e com o coração desejo agradecer a todos que possibilitaram esse experiência maravilhosa e que todos encontrem a felicidade e a paz.

Veja matéria sobre Vipassana.